Permitam-me efetuar uma brevíssima digressão sobre o assim designado "realismo fantástico".
Ele parece-me, em boa medida, caudatário, assim como a filosofia de Popper e a psicanálise de Freud, do cartesianismo clássico, consoante o qual o único indício de que existo consiste no fato de que ouço meus próprios pensamentos: nesse diapasão, temos acesso a uma única realidade, a saber, o nosso próprio pensamento, o resto é incógnita.
Por outro lado, a própria locução "realismo fantástico" encerra uma contradição em termos: deveras, o romance ficcional não tem nada de realista, ele é pura invenção, pura fantasia, conquanto procure mimetizar, em certa medida, a "realidade".
A literatura de ficção do "realismo", destarte, abriu as portas, paradoxalmente, ao realismo fantástico, tendo mesmo como corolário a literatura qualificada como "do absurdo", cujos expoentes mais destacados são, ao que me parece, Kafka, Beckett e Ionesco.
Mas deixo uma provocação: Descartes, Popper, Freud e outros, embora racionalistas e, portanto, avessos ao empirismo, acreditavam na ciência e em certa verdade que ela possa alcançar.
Será que o elemento "fantástico" da literatura ou do pensamento não é tributário e devedor da realidade empírica, de onde ele haure sua inspiração?
(por Luis Fernando Franco Martins Ferreira, historiador)
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