Em sua magistral obra intitulada "O nascimento da tragédia, ou helenismo e pessimismo", o filósofo Friedrich Nietzsche encetou uma fecunda distinção entre os impulsos artísticos apolíneo e dionisíaco, colimando demonstrar o renascimento do espírito da tragédia grega antiga no assim denominado "drama musical" de Richard Wagner, mas não parou por aí, pois também deduziu o aviltamento de tais impulsos artísticos pelo racionalismo socrático, que teria ferido mortalmente a arte grega mítica de Ésquilo e Sófocles.
Nietzsche, decerto, associava o impulso dionisíaco à música e à assim designada "natureza uno-primordial", bem assim o impulso apolíneo às artes plásticas e ao "princípio da individuação".
Eu ousaria aventar aqui a hipótese segundo a qual na própria música também encontram-se em permanente atividade e dinamismo os elementos encontradiços na arte em geral, a saber, os ingredientes dionisíaco, apolíneo e socrático.
Com efeito, a dissonância atonal e a indistinção natural e primordial dos sons pode muito bem ser atrelada ao impulso dionisíaco, enquanto as notas musicais individualmente consideradas e melodicamente justapostas acomodam-se perfeitamente ao impulso apolíneo e ao seu "princípio da individuação".
Já o elemento socrático-teórico, por assim dizer racionalista da música poderia corresponder às regras do tonalismo na teoria musical, que está em constante altercação com a dissonância atonal típica do gênio dionisíaco.
São hipóteses a desenvolver, sujeitas ao crivo crítico.
(por LUIS FERNANDO FRANCO MARTINS FERREIRA)