GRIEG, BRAHMS E OS HISTORIADORES
Recentemente voltei a ouvir dois inesquecíveis concertos para piano e orquestra, pelas mãos do solista brasileiro Nelson Freire, a saber: o do compositor norueguês Edvard Grieg, opus 16; e o de seu colega alemão Johannes Brahms, opus 83, de número dois.
Cuida-se de duas peças monumentais, cujas linhas melódicas já integram, por assim dizer, o imaginário coletivo daqueles que apreciam música, seja de qual gênero for.
Arrisco aqui alguns palpites e impressões sobre as mesmas.
A obra de Grieg, em cada um dos seus três movimentos, exibe-se predominantemente como justaposição de temas melódicos, dispostos em blocos estanques e desconexos, o que não remove de forma alguma a beleza embevecida de cada melodia.
Já a peça de Brahms mostra-se bem mais coesa, pois cada tema melódico surge como desenvolvimento necessário do anterior, em uma desinibição processual em que nada é deixado ao acaso, o que acaba por formar um todo sólido e inquebrantável.
Tais impressões conduzem-me a algumas ilações derivadas do cotejo com o ofício do historiador.
Nesse diapasão, quer me parecer que, se Edvard Grieg fosse um historiador, provavelmente estaria atrelado à corrente da assim designada história factual, ou, como dizem os franceses, "histoire evenementielle", a qual exalta os grandes feitos individuais e os acontecimentos mais estrondosos, geralmente do âmbito político.
Ao passo que Brahms seria provavelmente um historiador marxista ou da chamada Escola dos Annales, que se ocupam primordialmente dos processos, a saber, os liames que encadeiam os acontecimentos, colimando estabelecer inteligibilidade na narrativa dos fatos.
Ambas as correntes historiográficas exibem seu encanto e sua beleza, assim como as músicas de Grieg e Brahms, parecendo-me relevante anotar que os músicos, assim como os historiadores, também se ocupam do tempo: no caso dos primeiros, trata-se do som em movimento, do evolver das notas musicais no tempo.
(por LUIS FERNANDO FRANCO MARTINS FERREIRA)
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