sexta-feira, 29 de julho de 2016

PLATÃO, DOIS MIL ANOS DEPOIS.

O filósofo e matemático britânico Alfred North Whitehead, coautor dos Principia Mathematica com Bertrand Russell, tinha boa dose de razão ao afirmar que todo o pensamento filosófico ocidental não passava de glosas marginais à obra de Platão. 

Decerto, parece que tardou quase dois mil anos para que a filosofia ocidental esboçasse um começo de superação das dicotomias diretamente derivadas do trabalho do grande pensador grego, o qual, partindo do indivíduo humano, opôs corpo e alma e, assim, suscitou a autonomia do mundo das ideias. 

Com efeito, a oposição entre racionalismo e empirismo, entre o mundo das sensações e o mundo da inteligibilidade, bem assim todas as variações filosóficas derivadas dessa dicotomia, somente foram postas em questão com a dialética de Georg W. F. Hegel e Karl Marx, os quais, suplantando a perspectiva cognitiva do indivíduo, divisaram a inteligibilidade do tempo histórico das sociedades. 

Ora, ocorre que a perspectiva individual, a saber, o tempo de vida de um indivíduo não se mostra suficiente para apreender, pela experiência empírica, a dialética inerente ao tempo histórico vinculado à longa duração, aos grandes movimentos das sociedades, ou, em terminologia especificamente marxista, à lógica da sucessão dos modos de produção das sociedades: daí talvez a suposição platônica de que o mundo da inteligibilidade, ou o mundo das ideias, encerrasse autonomia em relação ao mundo material.  

Por isso é que apenas tardiamente esboçou-se a superação das dicotomias derivadas da perspectiva individual de Platão e seus glosadores ocidentais, mas os quase dois mil anos de seu predomínio filosófico apenas corroboram a majestade desse grande pensador, talvez o maior de que se tenha notícia.  

(por Luis Fernando Franco Martins Ferreira, historiador)