segunda-feira, 22 de junho de 2015

IDOLATRIA ALEMÃ, OU ÁPICES DOS OITOCENTOS.

Permitam-me, ainda uma vez, um brevíssimo e ligeiro exercício de introspecção egoísta e desprovido de pretensões atinentes à objetividade.

Ainda muito jovem, no século passado e muito antes de entrar na faculdade, tive o privilégio de travar contato com algumas obras humanas que modelaram indelevelmente meu caráter e meu pensamento, quais sejam:

1) “A ideologia alemã” e “O Capital”, de Karl Marx;

2) “Tristão e Isolda”, de Richard Wagner;

3) “Segundo concerto para piano e orquestra”, de Johannes Brahms.

É evidente que elas encerram muito em comum, produzidas que foram por expoentes da intelectualidade alemã do século XIX, um período que não poucos qualificariam de “romântico”, mas persisto em indagar: que traço mais concretamente perceptível as unifica, a ponto de sensibilizar perenemente um cidadão da classe média brasileira do último quartel do século XX, mas de forma tão incisiva que tal cidadão atribui a maior parte de sua compleição moral vigente a essas obras?

Resposta: não sei, talvez a própria pergunta seja impertinente, mas o certo é que o ápice do século XIX alemão se fez notavelmente presente e hodierno nesta figura que agora, mui humildemente, lhes dirige a palavra.

segunda-feira, 15 de junho de 2015

APORÉTICA MARXISTA.

Há uma aporia bem evidente na teoria marxista do valor, constante do livro primeiro de "O capital", que poderia ameaçar a consistência da mais-valia, sendo certo que já expus tal paradoxo em pequeno artigo publicado na revista "Mouro" número 8, de dezembro de 2013.

É o seguinte.

A mais-valia absoluta pressupõe a compra e venda de uma mercadoria singular, a força de trabalho.

Ocorre que a força de trabalho é um dado da natureza, e não o produto do trabalho humano, logo não encerra valor e, portanto, não pode figurar como mercadoria a ser vendida e comprada. 

A solução de tal aporia está, se bem compreendi, na própria obra de Karl Marx, sendo certo que parte dela eu também já expus no artigo acima referido.

Mais detalhes sobre tal aporética estão por vir, mas aguardo de bom grado eventuais críticas, comentários e sugestões.                        

domingo, 7 de junho de 2015

DUAS NOTAS SOBRE COMUNISMO.

Tomo a liberdade, com todo o devido respeito, de alinhavar duas singelas notas sobre o instigante e esmeradamente documentado artigo intitulado "Teoria do valor tupinambá: o lugar da natureza nas ideias econômicas", de autoria de Jorge Caldeira e publicado no jornal "Folha de São Paulo" aos 31 de maio do ano corrente:

1) Nas sociedades indígenas do Brasil pré-colonial, inclusa a tupinambá, predominava o modo de produção comunista primitivo, em que a terra, meio de produção natural (a saber, que não é fruto do trabalho humano) e característico de tais sociedades, figurava como propriedade coletiva da tribo, inexistindo propriedade privada dos meios de produção, de tal sorte que a consideração com as gerações vindouras da tribo consistia em elemento inerente à manutenção e preservação de tal propriedade coletiva tribal. 

2) O comunismo avançado, consoante concebido por Karl Marx em textos como "A ideologia alemã" e "O manifesto comunista", consiste em modo de produção que superará o capitalismo e cuja característica mais evidente é a propriedade coletiva mundial (ou seja, de toda a humanidade) dos meios de produção, sejam eles naturais ou já fruto do trabalho humano, de tal sorte que a consideração com as gerações vindouras de toda a humanidade será um elemento inerente dessa sociedade, do que se dessume que a preservação da natureza figurará decerto como imperativo do planejamento econômico de jaez mundial.                     
    

sábado, 6 de junho de 2015

FRANZ KAFKA, OU AS RAZÕES DO ABSURDO.

Titã inconteste da literatura universal, Franz Kafka descreve com linguagem burocrática, em novelas como “A metamorfose” e “O processo”, situações aparentemente absurdas que muito inspiraram outros gigantes da escrita, como o Eugène Ionesco de “O rinoceronte” e o Samuel Beckett de “Esperando Godot”.

A narrativa de Kafka, conquanto de precisão milimetricamente racional, insere seu leitor nas entranhas de um pesadelo, e nisso está sua proximidade com o Sigmund Freud de “A interpretação dos sonhos”, obra que disseca com instrumentos cirúrgicos a estrutura inteligível do pensamento que irrompe durante o sono.

Eis a questão de Kafka: elucidar racionalmente o absurdo, desvendar-lhe as razões. Pois o que aparenta ser uma quimera para o indivíduo pode talvez ser inteligível e lógico sob ponto de vista mais amplo, seja social ou histórico.

E aqui, evidentemente, entra a lógica dialética, tão cara a autores como Hegel e Marx, investigadores da inteligibilidade do tempo histórico, o qual sobrepuja, por óbvio, o indivíduo, sendo certo que lhes é cara a elucidação da racionalidade das contradições, os motores da história, no que suplantaram, sem aniquilar, a lógica aristotélica.

Talvez, portanto, todos os autores aqui aduzidos sejam tributários da lógica dialética (ou paraconsistente, como queiram), a única capaz de iluminar o absurdo aparente, as contradições do real, e nisso pode-se aventar que são todos iluministas, por mais estarrecedoras que possam soar suas obras.