sexta-feira, 26 de agosto de 2016

O SUJEITO COGNOSCENTE COMO SER SOCIAL, OU BREVÍSSIMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE EPISTEMOLOGIA MATERIALISTA.

O proletariado exsurge na história como a classe social por excelência, porquanto completamente despojada da propriedade dos meios de produção, o que lhe confere um caráter internacional e universal. 

Seus membros, bem assim seus intelectuais orgânicos (na acepção de Gramsci), são potencialmente capazes de alcançar uma consciência de classe que ultrapassa a consciência individual dos detentores de propriedade privada de meios de produção, como a burguesia e quejandos. 

Tal consciência de classe interfere no campo do conhecimento, eis que, superando a perspectiva individual, o proletariado e seus intelectuais orgânicos podem apreender uma duração que também suplanta a duração de uma vida individual, atingindo assim a história não apenas dos indivíduos, mas das classes sociais. 

Dessa forma, Marx e Engels, intelectuais orgânicos do proletariado, foram os pioneiros a descortinar a história das classes sociais e suas lutas respectivas, bem assim a história dos diversos modos de produção ao longo do tempo, cuja dinâmica revelaram na contradição entre as forças produtivas e as relações de produção. 

Nesse mesmo passo, restaram superadas, no âmbito da epistemologia, as perspectivas empirista e racionalista, vinculadas ao indivíduo como sujeito cognoscente, na medida em que o materialismo erigiu o ser social (ou a classe social) como ponto de partida para aquisição de conhecimento. 

(por Luis Fernando Franco Martins Ferreira, historiador).    

segunda-feira, 22 de agosto de 2016

HIPÓTESE SOBRE TEMPO HISTÓRICO E AMPLIAÇÃO DA NOÇÃO DE DURAÇÃO.

O grande historiador francês Fernand Braudel costumava, como é cediço, fragmentar a história humana em curta, média e longa durações, sendo certo que, a nosso sentir, neste último caso, a história humana de longa duração foi descortinada pela primeira vez mediante a descoberta da lógica da sucessão dos modos de produção por Marx e Engels, com a qual inauguraram o materialismo histórico. 

Mas como pode o indivíduo humano, na qualidade de sujeito cognoscente e adstrito, por evidente, à duração de uma vida, apreender pelo intelecto uma duração que exorbita o tempo dessa mesma vida?

Dir-se-á com os marxistas, no caso da longa duração da história humana, que o advento do proletariado e seu estudo, enquanto classe social portadora da possibilidade de superação do capital e, assim, da pré-história da humanidade (ver publicação anterior neste blog), consiste no fator que abre as portas para o conhecimento de toda essa pré-história humana, ou seja, de toda a lógica da sucessão dos modos de produção que antecedem a futura revolução proletária, a qual instaurará o comunismo em escala planetária. Isto porque, consoante o próprio Marx, "a anatomia do homem é a chave da anatomia do macaco", vale dizer, o advento do proletariado, subjugado pelo capital, descortina todas as formas de dominação social de classes nos modos de produção precedentes.

Mas o que dizer quanto a durações ainda mais longas, que exorbitam a história humana, como nos casos da história das espécies vivas (história natural) e da história dos corpos celestes e do próprio universo, anteriores ao homo sapiens

Em uma primeira aproximação desse objeto de epistemologia, peço licença para remeter meus caros leitores a outra publicação neste blog, intitulada A dobra, em que me socorro das teorias de Jean Piaget.

Todavia, em uma próxima publicação neste blog, por seu turno, quem sabe, poderemos aprofundar o tema de forma mais conveniente, vale dizer, poderemos revisitar o problema da ampliação da duração no conhecimento do tempo histórico. 

(por Luis Fernando Franco Martins Ferreira, historiador)        

segunda-feira, 15 de agosto de 2016

DUAS HIPÓTESES SOBRE MATERIALISMO HISTÓRICO.

A primeira hipótese, concisamente, consiste na ideia de que, em A ideologia alemã de Marx e Engels, em particular, enquanto houver divisão do mundo em classes sociais e em Estados nacionais, a "humanidade" somente pode ser um conceito vago e abstrato, ou seja, ideológico, sendo certo que sua realidade concreta, a saber, a da humanidade, somente será efetiva com o advento do comunismo em escala internacional, ou seja, com a extinção das classes sociais e também da divisão entre Estados nacionais. 

Logo, o comunismo é que inaugura a humanidade em seu sentido prático e concreto, e os indivíduos deixarão de ser meros vetores de determinações estruturais do capital (vide a obra de Louis Althusser) para desfrutarem da verdadeira liberdade, uma liberdade também prática e concreta. 

Nesse diapasão, o humanismo, no âmbito do materialismo histórico, é um humanismo histórico, prático e concreto, que divisa e peleja pela construção da verdadeira humanidade sob a égide do comunismo. 

A segunda hipótese, de jaez epistemológico, consiste na ideia de que o materialismo histórico exibe uma transcendência prática, isto é, o advento da apreensão cognitiva da história da humanidade sob a perspectiva materialista, em particular no que pertine aos mecanismos lógicos da sucessão dos modos de produção, somente foi possível porquanto a superação da pré-história da humanidade, na acepção acima, tornou-se uma possibilidade concreta com o advento da classe proletária dominada pelo capital.

Destarte, ao sujeito cognoscente tornou-se possível superar a perspectiva do indivíduo e sua experiência empírica imediata, adstrita ao tempo de uma vida humana, para alcançar a lógica concreta e materialista do tempo histórico da humanidade, somente porquanto a própria possibilidade de superação histórica e prática do capitalismo e, portanto, da pré-história da humanidade tornou-se também real e efetiva com o advento do proletariado como classe despojada dos meios de produção.  

São duas hipóteses em caráter bem embrionário à espera, respeitosamente, de contribuições e sugestões dos caros leitores. 

(por Luis Fernando Franco Martins Ferreira, historiador).       

quinta-feira, 4 de agosto de 2016

O DIÁLOGO COM AS FONTES NA METODOLOGIA DA HISTÓRIA.

Certa feita, meu professor de história medieval, o exímio historiador brasileiro Hilário Franco Júnior, fez uma instigante objeção ao método de seu colega britânico, o festejado marxista Perry Anderson, o qual, na obra Passagens da antiguidade ao feudalismo, não teria recorrido em seu trabalho às fontes primárias, documentais, adstringindo-se a manusear a historiografia disponível a propósito. 

Tal objeção antolha-se-nos bastante pertinente, conquanto problemática, senão vejamos. 

Ora, a historiografia disponível, em meu humilde sentir, não deve ser desprezada como fonte do trabalho do historiador, sob pena de se olvidar o avanço científico que ela representa (o "estado da arte", por assim dizer), como se todo o trabalho historiográfico fosse inócuo. Isaac Newton já advertia que enxergou mais longe pois apoiara-se sobre ombros de gigantes, e isto vale também para a história, como para as demais ciências humanas.   

Mas estou convicto de que o professor Hilário Franco Júnior aludia a uma questão metodológica mais delicada, a saber, o retorno às mesmas fontes primárias documentais. Bem, se a historiografia elaborada com fontes primárias guardasse o apanágio de dizer a verdade acabada sobre tais fontes, então, realmente, seria inútil e ocioso retornar indefinidamente a esses mesmos documentos, mas, evidentemente, não é isso o que ocorre nas ciências.           

O material empírico da disciplina histórica, a saber, isso a que tenho designado fontes primárias, não ostenta o condão de falar por si só, ele deve ser interrogado pelo historiador e, nesse caso, como aduzia Karl Marx, cada época da história humana formula as questões que lhe são pertinentes, e que pode responder. Por isso, as fontes primárias documentais devem ser sempre revisitadas, pois cada época histórica, considerando o avanço científico prévio, formula a tais fontes questões diversas por intermédio do ofício do historiador. 

Eis o interminável e necessário diálogo entre o historiador e suas fontes, primárias ou não, o qual garante o avanço científico da disciplina histórica. 

(por Luis Fernando Franco Martins Ferreira, historiador)